30 junho 2016

Desigualdade de Género - Portugal

“Enquanto as assimetrias ao nível do trabalho pago são cada vez menores, no trabalho não pago subsistem, mesmo entre os casais mais jovens, onde continuam a ser as mulheres a orquestrar a vida doméstica, enquanto eles ficam num papel de retaguarda”, aponta Heloísa Perista, coordenadora do estudo Os Usos do Tempo de Homens e de Mulheres em Portugal, desenvolvido, desde Outubro de 2014, pelo Centro de Estudos para a Intervenção Social, em parceria com a Comissão para a Igualdade no Trabalho e no Emprego. 


Feita a soma, e quando marido e mulher exercem uma actividade profissional fora de casa, as tarefas domésticas e com os filhos exigem em média às mulheres quatro horas e 17 minutos por dia, enquanto para os homens implicam apenas 2h37m. No grupo etário mais jovem (15-24 anos), a assimetria diminui ligeiramente, mas subsiste, com as jovens a registar mais 1h21m por dia do que os homens nas tarefas de casa e com os filhos.
De entre as tarefas domésticas rotineiras, 74,3% das mulheres declararam dedicar uma hora ou mais por dia a preparar refeições (contra 22,8% dos homens), 35,9% a limpar a casa (homens, 7,4%) e 10,5% a cuidar da roupa (1,4%). Antes como agora, eles dedicam-se mais a fazer compras, pagar contas, seguros e renda da casa e às reparações domésticas.



Não admira, assim, que 39,4% das mulheres inquiridas, contra 30,2% dos homens, subscrevam a afirmação “Na minha vida do dia-a-dia, raramente tenho tempo para fazer as coisas de que realmente gosto”. Ou, como explicita Ilda, numa família biparental, com filhas de 13 e 12 anos e um filho de nove: “[Tempo para mim] foi desse que abdiquei, claramente. O que me deixou algo desequilibrada. […] Leitura, trabalhos manuais, gosto de estar entretida de mãos, desde croché a jardinagem… portanto, tudo isso, ir ao cinema, ver televisão — tudo isso ficou para trás.” 
“Abdicar e ajudar são palavras-chave”, interpreta Heloísa Perista, numa primeira análise ao estudo que resultou de cerca de dez mil inquéritos e cujas conclusões serão ainda alvo de uma análise mais fina, lá para finais de Setembro. “As mulheres abdicam muito mais do que os homens do tempo para si próprias e, portanto, deixam de fazer coisas que também lhes dariam gratificação, seja sentar-se no sofá a ler um livro ou fazer jardinagem, e projectam-nas para um futuro longínquo”, prossegue.





Curiosamente, e apesar das assimetrias constatadas, o estudo mostra que cerca de sete em cada dez mulheres consideram que a parte que lhes cabe das tarefas domésticas corresponde ao que é justo. “Há uma naturalização, tanto de homens como de mulheres, relativamente ao que continua a ser socialmente esperado de si, no contexto das famílias. E daí este grau menos apurado de percepção das injustiças que rodeiam esta realidade”, aponta a coordenadora do estudo.


Fonte: NATÁLIA FARIA ,público

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